A senhorinha M. 91c

Mora num residencial aqui em nossa cidade a senhorinha M., uma octogenária. Magra, de baixa estatura é muito observadora com seus pequeninos olhos fundos. Poderia ser avó de muitos entre nós. Ela vive só em seu apartamento tolhida pelo medo. Sente-se insegura.

“Aqui mora muita gente boa, mas, também, muita gente ruim.”

Ela tem um cachorrinho que fica dentro da casa para dar alerta em caso de alguma ameaça.

Há pouco tempo, um dia desses viveu momentos de pavor.

Ainda era madrugada e, de repente, começaram a chegar carros da polícia.

Chegaram com tudo, quase ao mesmo tempo, agindo rápido, procurando por bandidos. Era uma operação planejada, tinham até mandado de busca e apreensão, na linguagem policialesca.

Ela percebeu toda a movimentação e ficou muito assustada. Escutou ruídos estranhos, latidos de cachorros, barulhos de portas sendo arrebentadas para permitir a invasão e, talvez, pegar alguém em flagrante delito.

“Deixei a porta da minha casa meio aberta para que não fosse arrebentada”, disse, revelando um cuidado preventivo, já que acredita que ninguém, vendo-a, iria tratá-la como um delinquente.

“Levaram uns homens daqui, acho que foram presos”, comentou imaginando que os policiais tinham algum motivo grave para tomar essa atitude.

A operação acabou! Ufa! M. resolveu fazer o relato para dizer que se sente muito insegura, que pretende vender sua Casinha e ir morar num barraco, para se livrar desses episódios assustadores.

“Sempre que sinto medo, procuro ajuda da minha vizinha de cima. Já vi coisas por aqui que me fizeram ligar para a polícia, mas eles não vêm, quando chamo.”

M. é uma velhinha simpática, lúcida, observadora, mas, é provável, que se sinta só em sua casa, e também demonstra insegurança no ambiente em que vive.

Consultei os meus botões. Será que no cenário dos serviços  municipais aos cidadãos e cidadãs existe uma modalidade de acolhimento proativo que possa cuidar de casos como esse, de forma humanitária?  

Acho que deveriam fazer uma visita a ela, conversar e tomar alguma atitude para que, nesta altura da vida, com uma voz levemente arrastada pela idade, ela possa ter uma vida digna, despojada desse medo pesado e ter pelo menos alguns momentos de paz. (C.R.)

Carlos Rossini 71725n

Carlos Rossini é jornalista, sociólogo, escritor e professor universitário, tendo sido professor de jornalismo por vinte anos. Trabalhou em veículos de comunicação nas funções de repórter, redator, editor, articulista e colaborador, como Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Diário Popular, entre outros. Ao transferir a revista vitrine, versão imprensa, de São Paulo para Ibiúna há alguns anos, iniciou uma nova experiência profissional, dedicando-se ao jornalismo regional, depois de cumprir uma trajetória bem-sucedida na grande imprensa brasileira. Seu primeiro livro A Coragem de Comunicar foi lançado na Bienal do Livro em São Paulo no ano 2000, pela editora Madras.

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